Caim deu origem a uma linhagem irada, perversa, orgulhosa e que foge de Deus. Por mais que da linhagem de Sete, outro filho de Adão e Eva, o nome do Senhor começou a ser novamente invocado, o pecado continuou a exibir os seus frutos no coração do ser humano, que apressou o seu caminho para a destruição. No capítulo seis de Gênesis, o cenário é caótico. Os homens estavam totalmente entregues ao pecado. Uma das expressões mais fortes das Escrituras se encontra nesse momento:
“O SENHOR viu que a perversidade do homem tinha aumentado na terra e que toda a inclinação dos pensamentos do seu coração era sempre e somente para o mal. Então o SENHOR arrependeu-se de ter feito o homem sobre a terra, e isso cortou-lhe o coração”
Deus lidará novamente com o caos, como na criação da terra e na queda de Adão e Eva. Ele levantará um homem chamado Noé. Homem justo, reto em suas gerações e que andava com Deus. Assim Noé é descrito na Bíblia (Gênesis 6:9). Deus o comissionou para construir uma arca, que o abrigaria com toda a sua família, e abrigaria todas as espécies de animais terrestres e aves. Essa tarefa exigiu fé e obediência de Noé, pois nunca havia chovido, e Deus havia prometido um dilúvio que inundaria toda a terra.
Ira e juízo são, normalmente, as primeiras palavras que ocorrem em nossa mente quando ouvimos a respeito dessa história. Precisamos, porém, lembrar que amar não é sempre dizer sim. Muitas vezes, nossos pais demonstraram amor por nós nos corrigindo por um erro cometido. Assim como nem sempre um filho entende a atitude de seus pais, temos dificuldade de entender a atitude de Deus no dilúvio. Contudo, o cerne de toda essa história é a preservação da vida humana.
A criação sofreu mais uma vez por causa do pecado da humanidade. Como consequência do pecado de Adão, a terra produziu espinhos e cardos, e experimentou a maldição. Agora, toda a criação experimentará o terror e a morte. Porém, todo esse sofrimento era necessário para que houvesse um recomeço. Deus não criou a terra nem o ser humano para experimentarem todo esse sofrimento, que é consequência do pecado. O agir de Deus é sempre para o bem e nunca para o mal. Deus é bom, Ele é amor! As atitudes drásticas de Deus não anulam sua bondade e seu amor. Deus não deixou de ser amor por enviar o dilúvio. Pelo contrário, Ele fez isso porque é amor. O juízo de Deus nunca é “vazio” de amor, pois amor não algo que Deus tem, é quem Deus é.
Como vimos, o ser humano entregue ao pecado se torna excessivamente maligno e segue para a destruição. Se Deus não agisse no curso da história, a humanidade haveria se autoexterminado. Deus olhou para terra e achou apenas um homem que andava com Ele.
Qualquer um poderia ser salvo, pois a arca não era apenas para Noé e sua família. Para ser salvo do dilúvio, bastaria apenas crer no que Noé dizia e entrar no barco. O tempo para abandonar a incredulidade e descaso por Deus foi de aproximadamente cem anos, escolhendo, assim, crer que Ele era real. Porém, a Bíblia relata que ninguém creu, e apenas Noé e sua família foram salvos. Deus providenciou um meio de salvação, mas Ele não obrigou ninguém a entrar. A salvação deve ser fruto de uma escolha pessoal e não de uma manipulação. Se a pessoa não decidir crer na Palavra de Deus, mesmo que seja a respeito de algo aparentemente impossível, não há como se salvar. O dilúvio, então, foi uma intervenção divina de juízo e amor no curso da história da humanidade, tendo em vista a sua preservação para o cumprimento da promessa de redenção.
A ALIANÇA
Após os quarenta dias e as quarenta noites ininterruptos de chuva, e o processo de escoamento de toda a água, Noé e sua família deixaram a arca. Sua primeira atitude, registrada na história pós-arca, foi oferecer sacrifícios ao Senhor. Noé pegou os animais limpos que haviam na arca, já reservados para isso, e derramou o sangue deles sobre um altar em oferta a Deus. Esse é o sangue da aliança noaica.
Em seguida, Deus começou a proferir as palavras dessa aliança. Note que as palavras da aliança de preservação são muito similares às da aliança da criação.
“E abençoou Deus a Noé e a seus filhos, e disse-lhes: Frutificai e multiplicai-vos e enchei a terra. E o temor de vós e o pavor de vós virão sobre todo o animal da terra e sobre toda a ave dos céus; tudo o que se move sobre a terra, e todos os peixes do mar, nas vossas mãos são entregues. […] Mas vós frutificai e multiplicai-vos; povoai abundantemente a terra, e multiplicai-vos nela.”
As mesmas promessas de bênção que foram proferidas a Adão e Eva agora foram endereçadas a Noé e sua família. Isso nos prova que Deus não mudou de ideia em relação à humanidade, não se arrependeu no sentido de mudança de direção ou mente. Deus deu continuidade ao seu plano original para a raça humana.
Noé, agora, deveria ser o representante de Deus na terra, tendo domínio sobre toda a criação, debaixo da orientação de Deus. Tudo o que Noé precisava para cumprir a expectativa divina já estava liberado sobre ele através de cada bênção proferida por Deus nessa aliança. Cabia a ele apenas obedecer, ou melhor, permanecer em uma posição de obediência.
Essa aliança é uma das mais abrangentes, pois incorpora não apenas Noé e sua família, mas também todos animais e toda a criação. Isso revela que o plano redenção atingirá não apenas a humanidade, mas toda a terra. Há um envolvimento íntimo da redenção do ser humano com a redenção da terra. O apóstolo Paulo escreve aos romanos que a criação geme aguardando ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus. A própria terra experimentará uma transformação com a consumação do plano de redenção. A essas promessas é acrescentado um juramento maravilhoso:
“E O SENHOR sentiu o suave cheiro, e o SENHOR disse em seu coração: Não tornarei mais a amaldiçoar a terra por causa do homem; porque a imaginação do coração do homem é má desde a sua meninice, nem tornarei mais a ferir todo o vivente, como fiz. Enquanto a terra durar, sementeira e sega, e frio e calor, e verão e inverno, e dia e noite, não cessarão.”
“E eu convosco estabeleço a minha aliança, que não será mais destruída toda a carne pelas águas do dilúvio e que não haverá mais dilúvio, para destruir a terra.” Gênesis 9:11
Junto com a promessa e o juramento de preservação, Deus proclama os termos dessa aliança. Deus jurou preservar a humanidade, mas o ser humano deveria ser o seu cooperador. Pela primeira vez nas Escrituras é inserido um princípio legal, ou seja, um princípio que visa reger a conduta humana.
“Quem derramar sangue do homem, pelo homem seu sangue será derramado; porque à imagem de Deus foi o homem criado.”
O objetivo é a preservação da vida. O ser humano é autorizado a exercer juízo sobre o assassino. sendo um agente divino de justiça e preservação.
Caim foi o primeiro assassino, mas, depois dele, esse tipo de maldade se multiplicou a tal ponto que vemos um dos seus descendentes se orgulhando de ter matado pessoas. Para que o ser humano entendesse que Deus respeitava a vida humana, Ele o ensinou, através desse termo de aliança, que o assassino deve receber a justa punição de seu ato, tornando-se um exemplo para todo aquele que quisesse trilhar o mesmo caminho. A vida humana deve ser preservada, pois o ser humano carrega consigo a imagem de Deus.
Por fim, para que não haja dúvidas em relação às promessas que fez, Deus insere na criação algo que não existia.
“O meu arco tenho posto nas nuvens; este será por sinal da aliança entre mim e a terra. E acontecerá que, quando eu trouxer nuvens sobre a terra, aparecerá o arco nas nuvens. Então me lembrarei da minha aliança, que está entre mim e vós, e entre toda a alma vivente de toda a carne; e as águas não se tornarão mais em dilúvio para destruir toda a carne. E estará o arco nas nuvens, e eu o verei, para me lembrar da aliança eterna entre Deus e toda a alma vivente de toda a carne, que está sobre a terra.”
A palavra hebraica traduzida por “arco” tem um uso militar. E a mesma palavra traduzida como arma de caçadores e guerreiros, que eram utilizadas para no dia da batalha. Quando Deus diz que está colocando o seu arco nas nuvens, a ideia que o texto traz é a de um guerreiro colocando sua arma de lado ara o momento de descanso. Deus está dizendo ao ser humano e a toda a criação, com o arco que trouxe à terra, que o dilúvio não seria mais usado. Aquilo que foi usado como juízo agora é símbolo de uma aliança encharcada de graça, por meio da qual o Criador preservará a vida da humanidade sobre a terra. Se o arco-íris aparece na terra em algumas ocasiões, no trono de Deus, no céu, é presença permanente.
“Aquele que estava assentado era de aspecto semelhante a jaspe e sardônio. Um arco-íris, parecendo uma esmeralda, circundava o trono.”
Não importa o que aconteça, Deus cumprirá a sua Palavra. Essa é uma aliança eterna e irrevogável, que não depende da resposta do ser humano para permanecer firme. Desde Noé, a humanidade já mereceu inúmeros dilúvios. As atitudes das pessoas entregues ao pecado já se multiplicaram sobre toda a terra, mas Deus não tornará a dstruí-la pelas águas do dilúvio. Ele abriu mão de seu arco e derramou sobre nós sua graça.
Texto extraído do livro “Aliança de Sangue”
Autor: Leonardo Capochim é natural do Rio de Janeiro, exerce o ministério pastoral há oito anos. Professor e diretor do Seminário Teológico Carisma. Leonardo e sua esposa Vanessa servem a Deus na Igreja Batista da Lagoinha, em Belo Horizonte.